domingo, 16 de novembro de 2008

G20: não mais que um G8 alargado, com a mesma liderança, e com mandatários de Obama…


Na Cimeira do G-20 sobre os Mercados Financeiros e a Economia Global, os líderes desses países concordaram com um plano de acção imediata e medidas de médio prazo no tratamento da situação financeira e económica internacional.
As tarefas incluem o reforço da transparência e da responsabilização, reforçando uma boa regulação, promovendo a integridade dos mercados financeiros, reforçando a cooperação internacional e promovendo a reforma das instituições financeiras internacionais.

As decisões da cimeira de ontem da Casa Branca, convocada por Bush, reflectem intenções a serem eventualmente concretizadas nos próximos meses, até a sua reavaliação em nova cimeira em Abril. A cimeira incorporou países que não participam dos G8 para satisfazer, em termos de imagem, reivindicações de maior equidade feita por outros países, sem que os EUA percam a sua liderança, e abriram perspectivas para desbloquear alguns impasses na negociações relativas ao comércio mundial. Os países mais pequenos e em desenvolvimento têm, com fundadas razões, duvidado da representatividade indirecta nestas reuniões que poderiam advir da presença de diversas economias emergentes.

Os dirigentes de alguns países "ocidentais" estão fragilizados junto das opiniões públicas nacionais que os vêem como co-responsáveis, com Bush, da crise financeira internacional e que entendem que para dear a crise, não se pode ficar pelas recapitalizações feitas à custa do erário público e pelas garantias do Estado ao sector bancário e pretender-se alguma independência dos EUA, o abandono do domínio do dólar, na alteração completa das lideranças e políticas do Banco Mundial e FMI, na exigência aos EUA e Europa que resolvam os seus problemas internos e travem as suas recessões, evitando o contágio pernicioso para o crescimento dos países emergentes. Os efeitos da falta de créditos e de contensão de riscos da rfecessão nos países mais ricos, atingirão as exportações dos países em vias de desenvolvimento e poderão trazer um novo ciclo da sua pauperização.
Os chamados países desenvolvidos, face à reclamação de uma maior participação das economias emergentes nos centros de decisão e de um muiltilateralimo, têm respondido que se esses países querem ter mais poder devem pagar mais...Como se não estivessem já hoje a pagar excessivamente pelos desmandos no sistema financeiro, centrados nos EUA. E revelando a clara intenção de não corrigirem muito as causas da crise e de porem o resto do mundo a pagar as suas asneiras…

Muitos governos adoptaram uma postura crítica em relação à política norte-americana, como Sarkozy e mesmo Sócrates, mas o que agora se viu foi a reverência de canalizar para as suas instituições bancárias fortunas dos contribuintes para estas manterem uma relação desigual com os países em vias de desenvolvimento com os quais quer os EUA quer a UE andam a tentar acordos laterais que preejudicam o peso regional dessas economias e o seu poder nacional conjunto. Ontem Morales já referia esta questão.

Uma solução para esta crise só pode ser alcançada através de um processo de "desarmamento financeiro", tal como inicialmente formulado por John Maynard Keynes, que contesta veementemente a hegemonia das instituições financeiras da Wall Street, incluindo o seu controle sobre a política monetária.
Retomando a carta aberta a que aqui já fizemos referência noutro local, da iniciativa de Paul Davidson e Henry Liu (1):


“O Inverno de 2008-2009 provará ser do descontentamento económico global que marca a rejeição da ideologia de que mercados financeiros globais não regulamentados promovem a inovação, a eficiência do mercado, o crescimento sem restrições e a prosperidade sem fim ao mesmo tempo que reduzem o risco através da sua difusão por todo o sistema. Durante mais de três décadas a corrente dominante de economistas neoliberais pregou, e os reguladores aceitaram, o mito da eficiência dos mercados não regulamentados, ignorando a lição crítica proporcionada pela análise de John Maynard Keynes da interelação dos mercados financeiros e do sistema de pagamentos internacional.Aqueles que não aprenderem as lições da história estão destinados a repetir as suas tragédias. Os economistas neoliberais nas últimas três décadas negaram a possibilidade de uma repetição da Grande Depressão à escala mundial após o colapso da bolha especulativa criada pelos mercados financeiros sem restrições dos EUA dos "Frenéticos anos 20". Enganaram-se a si próprios ao pensar que a falsa prosperidade construída sobre a dívida poderia ser sustentável com a complacência monetária. Agora a história está a repetir-se, desta vez com o vírus novo e mais letal que infestou os mercados financeiros globais desregulamentados: a "inovadora" titularização de dívidas, as finanças estruturadas e as operações bancárias independentes inundadas com o excesso de liquidez libertado por bancos centrais acomodatícios. Uma estrutura maciça de riqueza fantasma foi construída sobre a areia movediça da manipulação da dívida. Esta bolha da dívida implodiu finalmente em Julho de 2007 e agora está a ameaçar deitar abaixo todo o sistema financeiro global e a provocar um colapso económico a menos que uma liderança política esclarecida adopte medidas correctivas à escala global. O problema das hipotecas sub-prime dos EUA, que começou em 2007, redundou, como era de esperar, num pântano que provocou a quebra dos mercados financeiros interligados e que ameaçou a viabilidade de instituições financeiras à escala mundial, pelo contágio propagado à velocidade electrónica através de um antiquado e disfuncional sistema internacional de pagamentos.Para deter o colapso financeiro global, pode-se aprender muito com a visão de Keynes de como o sistema internacional de pagamentos deveria funcionar para permitir a cada país promover uma política de pleno emprego sem ter de temer problemas da balança de pagamentos ou permitir que incidentes financeiros infectem o sistema bancário interno e os sistemas financeiros não-bancários.
Uma outra Grande Depressão pode ser evitada se os líderes mundiais reconsiderarem o sistema analítico de John Maynard Keynes que contribuiu para a era dourada do primeiro quarto de século após a Segunda Guerra Mundial. Os signatários e outros há muito advogam uma nova arquitectura financeira internacional baseada numa versão actualizada para o século XXI do Plano Keynes originalmente proposta em Bretton Woods no ano de 1944.
Esta nova arquitectura financeira internacional tem como objectivo criar (a) um novo regime monetário global que opere sem ~uma divisa hegemónica, (b) um relacionamentodo comércio global que apoie o desenvolvimento interno em vez de o atrasar e (c) um clima económico global que promova incentivos para que cada país promova o pleno emprego e aumente os salários da sua força de trabalho.”


As cúpulas do G20 não puseram em causa a legitimidade dos hedge funds e dos vários instrumentos de deriva no comércio mundial. O comunicado final inclui um impreciso e desfocado empenho "numa melhor regulação dos fundos hedge e na criação de mais transparência nos títulos ligados às hipotecas como forma de travar uma deriva económica blobal." Às agências de rating, aos off-shores e aos credit default swaps foram feitas umas cócegas inconsequentes. O mesmo aconteceu com o BM e o FMI.
Como o DN hoje refere "Quem deverá ter achado que a conferência ficou aquém do desejado é o presidente russo, Evgeni Medvedev, cujas propostas não mereceram consenso. No seu discurso, o representante da Rússia defendeu a refundação do sistema financeiro internacional, com novas ideias e novas estruturas na base de princípios fixados por acordos formais a nível internacional. Uma comissão de gurus financeiros independentes e reconhecidos a nível global deveriam submeter as suas propostas concretas aos países do G-20, a instância futura de regulação económica global. O G8, agrupamento dos países mais ricos, deverá concentrar-se nos temas da segurança internacional. Finalmente, Medvedev propôs a criação de centros financeiros regionais, com a criação de mais divisas que agreguem o maior número de países em cada região"


Apesar da comunicação social portuguesa, e não só, quererem atribuir “interesse jornalístico” ao referirem que Barack Obama estava ausente desta conferência, o facto é que, quer Madeleine Albright quer Jim Leach, ex-governantes de Clinton e Bush, respectivamente, mandatados por Obama, tiveram nos dias 13, 14 e 15, encontros com ministros e outros membros destacados das delegações da Alemanha, Inglaterra, Rússia, China, India, Austrália, Japão, França, Itália, Canadá, México e Argentina bem como com o chefe de gabinete de Durã Barroso e com o próprio secretário-geral da ONU (2). O condicionamento de decisões a serem retomadas mais à frente, com o argumento de que Obama ainda não está em funções, terá sido uma forma airosa de justificar uma não correspondência com pressões de vários países emergentes, potências regionais, que não quererão ficar pelas generalidades das conclusões saídas da conferênca que continuam a conformar-se com a supremacia de Washington.
A presença nesta cimeira de representantes de Obama e de Biden reflecte, aliás, o consenso estabelecido nos EUA entre Washington e a Wall Street.
Seja qual fôr a valorização pesoal que se faça dos objectivos e intenções de Obama, e não deixando de considerar que se mantem vivo um grande movimento de esperança na mudança, não se pode ignorar que o Presidente eleito é o vértice de uma pirâmide onde estão inatalados os interesses económicos e militares que há dezenas de anos têm assegurado ou disputado uma hegemonia castradora do que de mais fundo se encontra nasa aspirações desse movimento.
E não foram sinais de estímulo ao peso autónomo desse movimento no curso da vida política que começaram a ser dados. Pelo contrário, o movimento de cadeiras realça o peso do stato quo e dos compromissos contra natura em relação a tanta esperança.

(1) Respectivamente editor do jornal Economia Pós-Keynesiana e Professor Convidado da Universidade do Missouri (Kansas City).
(2)
http://www.mlive.com/us-politics/index.ssf/2008/11/albright_and_leach_make_the_ro.html

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