terça-feira, 24 de junho de 2008

Um amigo na campanha de Obama


O Sousa Marques continua a estar presente com a sua experiência de activista da campanha de Obama


6. POLITIZAR O MEDO



1. Charlie Black é o Director Estratégico da candidatura McCain (chief campaign strategist). À revista Fortune disse o seguinte: "Um ataque terrorista no solo americano representaria certamente uma grande vantagem para o candidato do Partido Republicano". Charlie Black é também um dos três membros do staff da candidatura de McCain que, no passado, estiveram ligados ao célebre caso Enron, uma empresa que faliu estrondosamente e que lesou muitos milhares de apostadores da Bolsa (muitos de vós lembram-se certamente dessa história).



2. Certamente disse o que pensava, dizendo no entanto o que nunca deveria dizer. Por aqui há uma expressão muito utilizada quando se fala de uma grande surpresa que é preparada para Outubro, umas semanas antes das eleições presidenciais (que, tradicionalmente, se realizam na primeira terça-feira de Novembro): "A primeira regra da Surpresa de Outubro é não falar da Surpresa de Outubro".



3. Charlie Black não se limitou a expressar esse pensamento. Explicou com o exemplo do atentado que levou à morte, no Paquistão, a candidata da oposição Benazir Bhutto. Também poderia ter falado do atentado de Madrid (10 bombas e 191 mortos), três dias antes das eleições gerais de 2004 em Espanha e que foi aproveitado pelo Primeiro-Ministro no poder, José María Aznar, para acusar a ETA, mesmo quando havia provas de que se tratava de um atentado terrorista não organizado pela ETA.



4. Quando um jornalista perguntou a McCain qual o significado das palavras do seu Director de campanha, respondeu: "Não posso imaginar porque terá dito isso. Não é verdade". Depois foi a vez de membros da candidatura afirmarem que o Sr. Black não se recordava de ter dito aquilo à Fortune. Mas o próprio Charlie Black veio, mais tarde, "lamentar profundamente os seus comentários". Como referiu o jornalista Keith Olberman (msnbc - Countdown): "Black lamenta profundamente ter dito aquilo que os seus colegas de campanha afirmaram que ele não se recordava de ter dito"!!!



5. Para lá da enormidade do erro e da brutalidade do disparate o que se torna claro é o seguinte:



a) Alguém (o director da candidatura, ainda por cima!) disse o que, dentro da própria candidatura e no meio dos "círculos geralmente mais bem informados", já se sabia que constava: um certo desejo que acontecesse qualquer coisa em Outubro, umas semanas ou uns dias antes de 4 de Novembro. Pela segunda vez (recorde-se o acidente de Hillary Clinton quando referiu o assassinato de Robert Kennedy para justificar a sua manutenção na campanha das Primárias até à Convenção Democrática de Agosto) se fala de "qualquer coisa que possa vir a acontecer" e que possa interferir na campanha eleitoral...



b) Em muitos países, é prática comum politizar as questões de segurança nacional. Por aqui, quem o costuma fazer é o Partido Republicano porque, de certa maneira, encarna a política crua e dura da chamada "defesa dos interesses americanos". A candidatura McCain limita-se a, sem imaginação, repetir velhos slogans. O drama para eles é que os americanos consideram que as questões mais importantes são a crise da economia, o fim (e não a continuação) da chamada guerra do Iraque, o problema da saúde, a crise da habitação, o desemprego. Só depois disso é que se preocupam com a segurança interna. Como é que os Republicanos conseguirão fazer com que este passe a ser o assunto que mais afecta os eleitores de Novembro?



c) A política do medo tem imperado, principalmente depois dos acontecimentos de 11 de Setembro de 2001. À conta disso a administração Bush montou a campanha que permitiria a invasão do Iraque e a sua reeleição em 2004. Amedrontar os eleitores e condicionar-lhes o voto é uma estratégia muito bem sabida e aplicada e que, no passado, deu óptimos resultados para quem dela beneficia. Também não é novidade que é coisa sabida há muito e aplicada nos mais diversos países. Muitos outros exemplos se podem recordar. Lembro-me da história que a minha avó me contava dos tempos de Sidónio Pais. Uma certa noite bateram à porta uns senhores que perguntaram pelo meu bisavô. Ela disse que ele ainda não tinha chegado e que eles entrassem para o esperar. Foi o que fizeram. Passou tempo e nada. Eles estavam com pressa. Tinham outras missões para cumprir. À saída prometeram voltar. Depois de saírem e da minha avó ter a certeza que o pai poderia estar a salvo, informou-o (ele estava escondido lá em casa!) e permitiu que ele fugisse e andasse a monte para não ser apanhado. Foi assim que o velho maçon escapou à morte certa...



d) O "terrorismo", mesmo quando não actua, paira como uma ameaça. Para além disso, como prova de força e influência, pode ser utilizado para condicionar os cidadãos e os eleitores. As suas forças escondidas são aproveitadas pelos que, afinal, precisam dele para continuar a fazer o chorudo negócio da guerra. Uma simbiose a que é preciso pôr fim. Só possível se houver uma política global capaz de, para lá de o combater com eficácia, enfraquecer a sua base de apoio, que bebe, por sua vez, das injustiças que grassam pelo mundo, dos extremos de riqueza e miséria, da propagação da ignorância, dos mil e um graves problemas que permanecem



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