A meta de cobertura integral de oferta da rede pública de pré-escolar tem sido enunciada, mas na prática não assumida, por sucessivos governos.
Em torno deste próprio conceito se geraram equívocos com um único objectivo: boa parte do acréscimo de despesa favorecer os privados.
Deve o Estado fazer protocolos com os privados? Sim, desde que os recursos sejam direccionados para a elevação da capacidade pedagógica dessa rede (em média mais baixa que o da rede pública do Estado), para praticar preços sociais, permitir actividades diversificadas durante o período não lectivo, para este não ser apenas "guarda das crianças" e para garantir qualidade. Isto quando a rede pública não consegue durante algum tempo garantir oferta, com essas características, nesses locais.
Porque, simultâneamente, e de acordo com a Constituição e as leis, deve o Estado garantir a expansão da oferta da rede pública.
Se é certo que, durante algum tempo, apesar da rede pública ser melhor, muitos pais optavam pelos privados, isso deveu-se fundamentalmente à oferta, que ela não garantia, de actividades posteriores às 15.30 h, quando terminava o período lectivo, até que os pais voltassem do trabalho.
A evolução globalmente positiva que se regista desde os anos oitenta, consistiu na passagem da cobertura do pré-escolar de 18% em 1980/81 para 77% em 2004/5.
Isto depois de um grande movimento de opinião pública à escala nacional em que sindicatos, autarquias e pedagogos tiveram um papel determinante. E que passou pela aprovação da Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar (lei nº 5/97). E períodos de consequente expansão da rede com papel determinante das autarquias. Mas também outros em que se privilegiou quase exclusivamente o apoio à rede privada.
Hoje há milhares de crianças que por razões de escassez de oferta, entre outras, não frequentam a rede publica e muitos milhares que se têm que conformar com uma rede privada, que garante parte das necessidades, mas que se mudariam para a rede pública se esta existisse. Revelando que a tal "liberdade de optar" é, por falta de condições, uma grande treta...
A criação recente de um horário diferenciado que prolonga a actividade lectiva, tornando-o diferente do resto do ensino básico, sacrificando a componente pedagógica apesar de argumentar com um suposto "interesse dos pais" pela função de guarda, é um retroceso e sinal de desprezo pela componente de ensino. E isto, apesar de hoje já haver um quadro legal que favorece, com a intervenção das autarquias em parceria com o os Ministérios da Educação e da Solidariedade Social, a resposta às necessidades das famílias e de ocupação das crianças em períodos de interrupção lectiva.
Está também ainda por garantir a existência de períodos de avaliação comuns com o restante ensino básico que permita a sequencialidade pedagógica ao longo desse percurso e a articulação da actividade com os restantes níveis de ensino. E uma atitude diferente da actual em que passaram a ser desrespeitados os períodos de planificação e avaliação, base essencial de sustentação do pré-escolar.
Mas há também a obrigatoriedade de frequência do Jardim de Infância no ano imediatamente anterior à entrada no 1.º Ciclo do Ensino Básico, bem como a criação de condições que permitam generalizar o acesso ao pré-escolar de todas as crianças com 3 e 4 anos. Só assim se contribuirá para uma efectiva igualdade de oportunidades no acesso à Educação e serão criadas condições favoráveis ao sucesso nas aprendizagens ao longo da vida, tal como reconhece o Parecer emitido, em 2004, pelo Conselho Nacional de Educação. Nesse Parecer, o CNE considera que cabe ao Estado a responsabilidade de garantir a todas crianças o acesso à Educação Pré-Escolar, sendo, ainda, recomendada a sua obrigatoriedade.
Este alargamento deverá ser assegurado, essencialmente, através de estabelecimentos públicos integrados na rede do Ministério da Educação, pois só dessa forma se garantirá que todas as crianças, independentemente do seu estrato social, terão acesso a um Jardim de Infância público, gratuito e de qualidade. Contudo, o encerramento de Jardins de Infância, sem criação de alternativas adequadas, como aconteceu no passado ano lectivo, contraria intenções enunciadas pelo Ministério.
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