quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O Público e Copenhaga: “aposta simples” e exorcização de esqueletos ou mercantilização do ambiente?

No Público de hoje, Rui Tavares desanca quem se recusa a ir na onda do internacional-porreirismo com que a União Europeia e os EUA apresentam a Cimeira de Copenhaga e quem esboça alternativas às soluções dominantes, apadrinhadas pela União Europeia.

Mais do que o blá, blá, blá pseudo-ambiental, da “resposta simples”, importaria que RT se pronunciasse sobre questões como:


- Considera-se cientista suficiente para duvidar da base científica dos muitos milhares de cientistas que contestam a importância relativa dada ao factor humano nas alterações climáticas ?E concorda com o "encerramento" desta discussão que Al Gore quer é, do ponto de vista da Ciência, uma posição avisada?


- Que avaliação faz sobre outros factores que influenciam as alterações climáticas (actividade solar, guerras e radiações nucleares, detritos industriais de alta capacidade de contaminação, etc.) para considerar que o factor humano (obviamente está a falar das emissões industriais de gases que influenciam o efeito de estufa, provocadas pela actividade económica) é decisivo para elas?


- Na sua classificação dos “cépticos” (adaptação não pouco inocente dos “euro-cépticos”) porque não incluiu os que apesar de recusarem a “convergência” delineada pela presidência dinamarquesa - num documento de facto preparada com os Estados Unidos e o Reino Unido - admitem, no entanto, o contributo das emissões gasosas para alterações climáticas, apresentaram soluções diferentes das dos países mais poderosos? Não considera essa sua atitude maniqueísta?

- Acha que estes e outros "cépticos" estão a fazer o jeito às teses anti-aquecimento global de Bush e Cheney?

- Sabe que o negociador dos EUA quando da declaração de Quioto, que os EUA não subscreveram causando toda a inconsequência dessa declaração de há 12 anos, se chamava Al Gore e que concordava com tais orientações de Clinton, então presidente?

- Quando Al Gore se lançou na campanha "contra" o aquecimento global, com um filme que continha trapaças pré-fabricadas, RT soube apontar-lhe quais eram?


- Acha que o Grupo dos 77 mais China ao reagir à declaração dinamarquesa se porta como um bando de arruaceiros e que nada têm para oferecer em alternativa? E que esse documento, depois de rejeitado, afinal não existia, era apenas um documento de trabalho, etc., etc.?


- O RT concorda ou não que os cortes das emissões gasosas têm que ser mais significativos nos países mais desenvolvidos, os maiores responsáveis pelo aquecimento que se terá verificado desde o início da industrialização?


- E que é injusto fazer idênticas exigências a outros países que nos últimos anos estão a fazer um esforço enorme para saírem do subdesenvolvimento, dos abismos das desigualdades e da fome?

- Quando Lula diz que "os países mais ricos falam muito mas fazem pouco" (alusão à grandiloquência das declarações de Obama e alguns dirigentes europeus), o RT acha que é ele que não está a ser "minimamente sério" e que o que Obama "nos tem que oferecer é muito"?


- Também está com aqueles opinion-makers dos burocratas de Bruxelas que dizem que a China e os EUA estão com metas “pouco ambiciosas”, admitindo que os ridículos 4% dos EUA podem ser comparados com a "decisão voluntária, baseada nas condições nacionais, mas com vontade de contribuir para o esforço global", da meta de Pequim de reduzir a intensidade das suas emissões até 45%?


- RT só fala nos acordos quanto às emissões de CO2. E as outras coisas que estão em cima da mesa e que terão que fazer parte de um acordo muito complexo?


- Se RT não o referiu, será que está de acordo com a mercantilização do ambiente, questão substancial da declaração da presidência dinamarquesa, que decorre da criação do comércio (mercado) de carbono que transferisse as preocupações universais na redução de gases de efeito de estufa para a gestão bolsista dos activos financeiros (fictícios…) de um novo mercado especulativo e com as consequências daí resultantes? Concorda com a presidência dinamarquesa em entregar essa gestão ao Banco Mundial? Ou acha que isto não é importante? Será também expressão de cepticismo não estar de acordo com isso?


- Outras questões em debate são as relacionadas com a “adaptação” e “mitigação”, em termos gerais, isto é, que inovações introduzir para que a redução de emissões afecte minimamente o desenvolvimento dos países menos desenvolvidos. Nesta matéria RT acha que a “transferência de tecnologia” necessária deve ser feita no respeito dos direitos de patentes ou no dos princípios da ajuda e cooperação, para que não ocorram novas formas de dominação neo-colonial, e em nome da “factura histórica” que os países mais desenvolvidos devem pagar? E acha que são exageradas as verbas pedidas pelos países menos desenvolvidos para proceder a essas adaptações?



A prosa de hoje de Rui Tavares é uma espécie de exorcização beata dos esqueletos do armário. Não contribui para trocas de pontos de vista sérias.

Se querem ver o contrário, vejam, por exemplo, o contributo à discussão que os comunistas ontem apresentaram para a questão e as correspondentes políticas domésticas.

E por aqui me fico…

2 comentários:

o castendo disse...

Estás linkado

Anónimo disse...

É um conjunto de lucidas observações à propaganda dominante sobre as alterações climáticas. Esse RT ficou mais obnubilado com ela desde que foi para o Parlamento Europeu. É apenas um exemplo da superficialidade com que responsáveis do BE abordam questões sérias.

Nuno