quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

A propósito das alterações climáticas e da Conferência de Copenhaga


1. O "mercado do carbono" arrisca arrastar a economia real para uma crise energética global de saída desconhecida mas eventualmente dramática?


Num artigo recente publicado no “Avante!”sobre as alterações climáticas e a próxima Conferência de Copenhaga, o professor e investigador Rui Namorado Rosa deu um contributo importante para um melhor esclarecimento sobre questões que têm estado colocadas num patamar de difícil compreensão, mesmo quando são fruto de intervenções de políticos portugueses como aconteceu neste fim de semana com Cavaco Silva.

Ao mesmo tempo que aconselhamos a sua leitura integral, salientamos algumas das questões aí abordadas pelo autor.


1. A Presidência da União Europeia, evocando a autoridade do IPCC (estrutura especializada estabelecida pela ONU), previu que uma elevação de 2.ºC provocada pela elevação do teor de CO2 na atmosfera seja a perturbação máxima tolerável; e que, para que tal perturbação não seja excedida no corrente século, o «mundo industrializado» deva reduzir as respectivas emissões em 25-40 % e os «países em desenvolvimento» em 15-30%, até 2020, relativamente a 1990.

Para Namorado Rosa começa por ser “surpreendente tal grau de precisão a longo prazo em matéria tão susceptível à nossa margem de ignorância sobre o mundo natural e à nossa ainda mais limitada capacidade de previsão na esfera económico-financeira. Recordemos a sucessão de «bolhas» financeiras que têm surpreendido e abalado os mercados de valores à volta do mundo, só nos passados vinte anos, com graves repercussões económico-sociais.


2. A EU foi um dos principais impulsionadores dos compromissos de Quioto que, aliás, não cumpriu bem como os EUA que os não subscrevera.

O autor conclui que será muito pouco razoável esperar que países emergentes que têm vindo a aumentar a sua riqueza e a realizar programas para a elevação geral das condições de vida da população, e que não foram abrangidos pela plataforma de Quioto, como a China ou a Índia, possam aceitar em Copenhaga reduções grandes das emissões de CO2, para as quais não têm contribuído de forma significativa.



3. A EU aponta a constituição e alargamento de mercados de transacção de títulos de emissões de carbono, estimulados por financiamentos públicos, como objectivo fulcral a atingir com capacidade de gerar fundos financeiros e títulos transaccionáveis para operar o mercado de carbono, o que na UE é designado por «esquema europeu de transacções» (ETS), apelando ao compromisso de alocar-lhe uma parte significativa das receitas geradas pelo «esquema europeu de transacções» a um fundo para evitar a desflorestação e degradação das florestas em países em desenvolvimento. A relação entre países desenvolvidos e países em vias de desenvolvimento parece, assim, ficar assinalada pela «grande preocupação» com a utilização dos solos, quando se fala na necessidade da reflorestação mas…omite-se a sobre-exploração de solos férteis pelos países mais ricos nos países mais pobres na produção de agro-combustíveis e bens agro-alimentares para o mercado global…

Rui Namorado Rosa conclui sobre esta matéria que “o comércio do carbono visa tornar-se num esquema de geração bilionária de activos financeiros fictícios ao serviço da sobrevivência do sistema capitalista. E arrisca arrastar a economia real para uma crise energética mundial de saída desconhecida e incerta, cujas consequências são potencialmente calamitosas.


4. Para alcançar esse desígnio, projecções distantes de alterações climáticas, que não podem ser nem confirmadas nem desmentidas, têm sido frequentemente utilizadas como instrumentos intimidatórios para justificar e fazer prevalecer «metas» e «medidas» igualmente insusceptíveis de justificação bastante.

Namorado Rosa cita o caso da cruzada de Al Gore como exemplificativa dessa pressão sobre a Conferência de Copenhaga, classificando-a como encenação ardilosa que procura formatar opiniões públicas visando lucros fabulosos.


5. Rui Namorado Rosa encerra o seu trabalho salientando que o enfoque colocado no problema das alterações climáticas em termos inacessíveis à análise objectiva e à compreensão das massas é um artifício que pretende desviar as atenções e confundir as questões fundamentais do presente e do futuro da sociedade humana, é pois também um ardil ideológico.


Para já não falar – digo eu - das principais preocupações dos portugueses que em recente sondagem, hoje divulgada em Bruxelas, começam pela pobreza, seguida da falta de alimentos e de água potável, relegando as alterações climáticas para sexto lugar, depois dos conflitos armados.

Não podendo negar as influências antropogénicas sobre o ambiente à superfície da Terra e sobre certos processos que actuam e conformam o clima planetário, nem tão pouco podendo ignorar a progressiva exaustão dos combustíveis fósseis e a escassez de diversos materiais com aplicações económicas especiais, em particular nas tecnologias energéticas, importaria avaliar objectivamente as situações de risco e os factores de constrangimento. E em conformidade orientar o esforço de investigação científica e desenvolvimento tecnológico e de investimento material para a respectiva resolução ou minoração.
Porém a «racionalidade» que nos tem sido proposta e imposta é a da regulação pelo mercado, sob a superintendência política das instituições intergovernamentais ou internacionais e sob a pressão de interesses económicos que visam objectivos próprios; nesse espaço actuam as corporações empresariais elas próprias, suas associações, diversas tipologias de organizações não governamentais, e em última instância os próprios governos. Mas estes já destituídos de plena capacidade diplomática e negocial por não serem de facto os únicos ou sequer os principais agentes de formação da opinião pública e da decisão política.

Daí a relevância da acção que cabe aos partidos políticos na auscultação e na informação das massas, contrariando a maré de alienação do conhecimento e da opinião pública, assim como no debate institucional e na formação da decisão política.

1 comentário:

Anónimo disse...

Textos interessantes mas demasiado extensos para um blog.