José
Rodrigues dos Santos está surpreso pelas críticas que têm sido
feitas ao seu trabalho de reportagem sobre as eleições gregas. Se ele não as
entende, vou aqui sumarizar -e tentar explicar.
Primeiro: Um órgão de informação que serve o seu público - e
não apaparica sem razão os seus empregados - não gasta um pipa de massa a
enviar um repórter para ele se limitar a fazer-se filmado no local, repetindo
"informações" insuficientemente confirmadas - pelo menos na sua
dimensão e relevância - que já chegaram aos ouvidos do público há pelo menos
cinco anos! Nem lhe estimula a histrionia de o fazer subir (acho que nem subiu,
mas falou como se lá estivesse) ao Parténon, para dar uma visão do alto (e de
repuxo, digo eu!) sobre a sociedade grega. Esta é a primeira bola a sair do
saco: não foi uma reportagem, não houve observação (ou se houve foi
miseravelmente fraquinha), houve apenas a teatralização de
"informações" de arquivo.
Segundo: Farto-me de explicar aos meus alunos de Ética do
Jornalismo que só há uma frase correta que comece por "os gregos
são". É a que termina em "...cidadãos da Grécia." Todas as
outras são generalizações apressadas. Por isso, o senhor professor doutor
universitário deveria dar uma palmada na sua meritória testa e mostrar-se
repeso de nunca lhe terem ensinado isso. "Os gregos inventam mil maneiras
de não pagar impostos" (ou algo assim), é uma frase tão falseadora como eu
dizer "os banqueiros só querem saber do seu lucro, seja por que meio
for", conquanto esta última tenha, proporcionalmente, muito mais hipóteses
de se aproximar da verdade - mas não deixa de ser uma generalização ilegítima.
Terceiro: "Muitos do que passam em frente da casa
comprada pelo ministro grego condenado por corrupção na compra de submarinos
são 'paralíticos' que subornaram médicos para o atestarem e receber mais um
subsidiozinho" (sentido da frase, não "ipsis verbis") é
enganador: em primeiro lugar, gera a ideia de que há uma romaria de gregos a
desfilar à frente da casa comprada pelo ministro condenado por corrupção (a única
verdade é esta condenação); por outro, o termo "muitos" não diz nada.
O romancista de História José Rodrigues dos Santos deve saber que, nos antigos,
os números 3, 7 ou 12 significavam "muitos" e 7x7 ou 12x12 indicavam
quase uma infinitude. Quantos são "muitos" falsos paralíticos: sendo
que um já é demais, dois são "muitos"? Dez? Mil? Dez mil?.
Quarto: Soou a desespero perante o irremediável a advertência
de que os gregos "não vão votar num partido de esquerda, mas da
extrema-esquerda", ai Jesus!, onde estão os óleos bentos e as fórmulas de
esconjuro! O Syriza é, de facto, uma Coligação da Esquerda Radical. É de
extrema-esquerda? Não sei. Por enquanto sei que é da esquerda radical - ou quer
sê-lo. Não é a mesma coisa: um professor doutor de universidade deveria, pelo menos,
ajudar a esclarecer as pessoas, confusas com tanta informação: radical tem a
ver com raiz. Pode significar cortar males pela raiz ou regressar às raízes -
da esquerda, no caso. Para afirmar que o Syriza é da extrema-esquerda, o senhor
professor doutor de universidades, que beneficiou do favor de uma viagem ao
Parténon para ver as coisas do alto, podia fazer o favor aos seus
telespectadores de explicar porque é que diz que o Syriza é da
extrema-esquerda. Acho que, após o que escrevi, me sinto legitimado a dizer que
as reportagens na Grécia de José Rodrigues dos Santos são uma bosta que eu não
deixaria passar a um estagiário. Ia completar "sem lhe afagar as
orelhas", mas contenho-me: não abro frentes de chacota numa discussão
séria. Ressalvo, ainda assim, que a bosta tem nutrientes que fazem vicejar e
estimulam o ciclo vital universal. Não posso dizer o mesmo das reportagens de
José Rodrigues dos Santos na Grécia. Será que algum malandro lhe disse que José
Sócrates era a "eminence grise" do Syriza?
3 comentários:
Muito bom!
Concordo, mas a referência chula às orelhas do repórter deslustra o texto. Ainda por cima dita dizendo que não se diz. Fica mal ao Óscar e não o eleva muito acima do criticado.
"janeiro 31, 2015 12:48 da manhã"
que exagero. queimar um povo inteiro comparado com uma provocação pessoal.
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