segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

A questão da moeda única e respostas que Portugal deve equacionar, por Carlos Carvalhas


(publicado no DN de 29/12/2012)

Comecemos então por lembrar que na altura da adesão à moeda única houve quem afirmasse que o euro era uma moeda que tenderia a valorizar-se, que a cotação do escudo que fixámos na entrada nos era desfavorável e que este quadro iria criar graves dificuldades à economia portuguesa.
Afirmou-se também, que o montante do Orçamento Comunitário era ridículo para efectuar uma compensadora redistribuição e ainda mais ridículo se tornou depois do “alargamento” a outros países.
A resposta a estes argumentos foi a da sobranceria, da negação pura e simples , ou a repetição de slogans e de princípios vazios de conteúdo que enfeitavam os discursos de circunstância: o «nivelamento por cima» em relação aos direitos sociais; o princípio da «coesão económica e social»; o princípio da solidariedade; a afirmação de que iríamos participar num mercado com dezenas de milhões de cidadãos com estabilidade cambial.
Os dados são conhecidos. Desde que o euro entrou em efectiva circulação até hoje o crescimento médio do nosso país foi nulo - dez anos perdidos - o investimento caiu a pique, muito do nosso aparelho produtivo e industrial foi destruído, alienou-se a nossa soberania e a dependência atingiu níveis inaceitáveis.
Criou-se a ilusão nos sucessivos governos desde a adesão ao euro que Portugal iria progredir com uma economia centrada essencialmente nos serviços, na financeirização da economia, no investimento estrangeiro e nas verbas dos diversos fundos europeus.
O que se verificou foi o crescente endividamento do país, primeiro privado, depois público e a acentuação do domínio do capital estrangeiro facilitado pelas privatizações, de tal modo que actualmente a saída líquida do país dos lucros e dividendos das empresas dominadas pelo estrangeiro já quase atinge as transferências líquidas que vêm da União Europeia. Esta é uma questão que só por si exigiria uma profunda reflexão.
Hoje são cada vez mais as vozes e os estudos a afirmar que o euro forte que serviu sobretudo à Alemanha não foi um factor de crescimento para o nosso país.
Associado ao Euro avançou-se com o PEC, plano dito de estabilidade e de crescimento que impôs regras arbitrárias sem ter em conta a situação específica e as estruturas económicas de cada um dos países, o que veio a criar grandes tensões.
Em 2003, tivemos uma crise e uma demonstração que as regras na UE são para aplicar desde que não atinjam os interesses centrais do directório das grandes potências. A Comissão questionou na altura os países com défices excessivos. Como quem estava em causa era a Alemanha e a França, o Presidente da Comissão, Romano Prodi reconheceu então, que as regras eram estúpidas mas não deu nenhum passo para as alterar ou eliminar. Hoje, com o novo Tratado da União Europeia estamos perante regras não menos estúpidas que, como já foi afirmado, reforçam as tendências centrífugas e a travagem económica que se materializará para muitos numa «austeridade perpétua»!
Ao prosseguir-se uma política monetária e cambial não conforme à diversidade das estruturas na UEM; ao prosseguir-se com a política do Banco Central Europeu (BCE) de não financiamento aos Estados, nem se preocupar com o emprego e crescimento económico, está a criar-se uma situação insustentável para muitos países.
A chamada crise do euro desencadeou várias reflexões e teses sobre o futuro desta moeda: a saída do euro da Grécia e de outros países; a saída da Alemanha (vozes ligadas ao grande patronato alemão, investigadores – Lordon - etc.); a criação de dois euros, um para os países da periferia outro para os países do norte; a eliminação do euro retomando cada país a sua moeda nacional, criando-se uma moeda comum; e a continuação do euro como está, com a ilusão de que o avanço do federalismo superará a crise!
A continuarem as principais regras e linhas da política económica e financeira na União Europeia, Portugal não tem futuro, não sairá do marasmo e da estagnação. Qualquer crescimento que venha a ter depois da grave recessão por que passa será sempre tão insuficiente que não dará para recuperar o emprego e pagar a dívida que é um garrote sobre a nossa economia.
A diminuição das taxas de juro e o alargamento dos prazos – renegociação da dívida – incluindo a anulação de parte é uma questão fundamental seja qual for o cenário que venhamos a ter pela frente.
A manutenção das políticas ditas de austeridade, contraindo cada vez mais o mercado interno e o investimento, cria uma dinâmica em que a quebra das receitas tende a superar o corte nas despesas, não reduzindo sequer o défice orçamental. Por sua vez a estratégia de resposta à crise centrada apenas nas exportações, com as tentativas de ganhos de competitividade assentes na desvalorização dos salários - desvalorização interna - está condenada ao fracasso como aliás até o FMI o afirma e demonstra.
Seja qual for o cenário que venhamos a ter pela frente a resposta aos nossos principais problemas passa pelo aumento da produção, pela defesa e valorização do aparelho produtivo, pela reindustrialização do país e pela melhoria da distribuição do Rendimento Nacional.
O Ministro da Economia descobriu recentemente a necessidade de reindustrializar o país.
Mas a reindustrialização do país não rima com a política do euro forte, com as privatizações, deslocalizações e o crédito caro e restritivo.
Apesar dos leilões de longo prazo promovidos pelo BCE, continua a haver cortes ao financiamento às empresas .
Recentemente – na cerimónia de entrega de prémios à exportação e internacionalização – foi afirmado que as taxas e verbas do BCE não se transmitem directamente à economia. Segundo a imprensa, o presidente do BES deu como exemplo o seu banco, que teve de reembolsar compromissos com entidades internacionais cujo valor foi o dobro da verba que obteve do Banco Central Europeu!
O endividamento da banca ao estrangeiro é incontornável. Mas o seu desendividamento e a superação das suas “imparidades”não pode ser feito à custa da economia e dos contribuintes em benefício dos banqueiros e dos grandes accionistas. Estima-se que as “imparidades” - prejuízos futuros - no crédito imobiliário atingirão os 20 mil milhões de euros .Compare-se com o corte dos 4 mil milhões que o governo quer fazer à custa do chamado Estado Social!
 É absolutamente necessário que a banca financie a economia e dê primazia às actividades produtivas e serviços de valor acrescentado e não às actividades especulativas. O Estado tem meios para o conseguir desde que não se subordine ao poder económico...
Estas algumas reflexões e propostas, no espaço que me foi concedido tendo por matriz uma União Europeia dita de nações livres, iguais e soberanas, mas de facto comandada pelos interesses da Alemanha e do do Directório das grandes potências em que a proclamada solidariedade não passa de um sublime exercício de hipocrisia

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