O Egipto e o Qatar bateram de frente na última reunião da Liga Árabe por causa do Estado Islâmico
O assunto passou quase despercebido, se é que não foi escondido, à douta comunicação social agora entretida a demonizar o Estado Islâmico, e com fartas razões para isso. Mas escapando-lhe o essencial.
E
o choque entre o Egipto e o Qatar faz parte do essencial, o oportunismo, a falta de vergonha e a desumanidade que campeiam nas relações internacionais.
O Egipto está em pânico com o Estado Islâmico porque o grupo se instalou no Sinai, onde continua a reforçar-se, em grande parte devido às consequências do golpe militar que, com o apoio dos Estados Unidos, da União Europeia e da NATO, restabeleceu o regime castrense no país trocando o general Mubarak, fora do prazo de validade, pelo general Al-Sisi. Além de terem espezinhado todos os valores democráticos manifestados através do movimento de Primavera Árabe – que no Egipto foi genuíno – os militares e os seus patronos lançaram-se numa caça contra a Irmandade Muçulmana, a qual, entre muitas culpas, a única que não tem é a de ter ganho com vastas maiorias absolutas todas as eleições livres e limpas realizadas no país. Para o melhor e o pior, é assim que funciona a democracia.
Até aqui, os militares egípcios foram compagnons de route do Qatar e outros regimes que têm como regime-mãe a ditadura terrorista da Arábia Saudita. O caldo entornou-se a seguir, principalmente quando a caça à Irmandade Muçulmana iniciada pelos militares egípcios provocou uma radicalização, óbvia, do islamismo egípcio, oportunidade que o Estado Islâmico não enjeitou. O Egipto viu-se então a braços com mais este problema, que o Qatar e todas as outras ditaduras do Golfo, sob a batuta da Arábia Saudita, continuam a alimentar sem que tal obste a que prossigam as suas alianças políticas, económicas e militares com o civilizado Ocidente.
Não é necessário ir muito fundo na análise para se perceber que qualquer estratégia montada contra o Estado Islâmico estará votada ao fracasso se não assentar no isolamento das petromonarquias do Golfo, os seus principais financiadores e recrutadores.
Ora nem essa entidade una e indivisível que dá pelo nome de eixo Estados Unidos-Israel, nem a União Europeia, deram qualquer sinal de confrontar a Arábia Saudita, o Qatar e apêndices com as consequências do seu apoio ao terrorismo islâmico. Pelo contrário, a família real saudita continua a refastelar-se nos Estados Unidos, a fazer circular toneladas de petrodólares sujos pelos circuitos financeiros internacionais; o Qatar é o menino bonito que prepara os estádios das mil e uma noites para o mundial de futebol de 2020, construídos com sangue de escravos; o Dubai & companhia transformaram-se em mecas do turismo novo-rico e em sujeitos admirados dos discursos basbaques de marionetes da política europeia, com Hollande e Renzi à cabeça; e o Bahrein continua a acoitar a estratégica Quinta Esquadra norte-americana.
Enquanto isso, o Egipto vê-se a contas com o Estado Islâmico no meio de uma crise social sem solução, mas em vez de o combater no Sinal vai fazer-lhe guerra na Líbia, isto é, cumpre a tarefa de que a NATO o incumbiu e que é a de tentar por um bocadinho de ordem num país que a NATO deixou no caos em que se encontra, fazendo-o desaparecer do mapa, que não do mapa dos grandes negócios do petróleo
.
Por tudo isto, o Egipto e o Qatar bateram de frente na última reunião da Liga Árabe. É a ordem natural das coisas quando a ordem internacional é guiada pela falta de vergonha.Nada mais previsível, é a ordem natural das coisas, o primeiro ficou com o Estado Islâmico em casa ao permitir que outros lhe façam os trabalhos de casa, e o segundo financia-o.
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