sexta-feira, 9 de maio de 2014

Notas sobre o DEO, José Alberto Lourenço


1.    O Documento de Estratégia Orçamental (DEO) 2014-2018, apresentado no final do passado mês de Abril constitui um dos documentos orçamentais mais pobres que algum governo produziu nos últimos tempos. As próximas eleições europeias condicionam claramente aquilo que o Governo diz neste documento e pode mesmo dizer-se que mais do que um Documento de Estratégia Orçamental (DEO) estamos perante um Documento de Estratégia Eleitoral (DEE).

    Percebe-se pela leitura do documento que apesar do Governo estimar um crescimento real do PIB ininterrupto, que varia entre os 1,2% no corrente ano e os 1,8% em 2017 e 2018, as políticas de austeridades são para continuar. Melhor dizendo o Governo irá continuar a atacar os salários e direitos dos trabalhadores nos próximos anos, em especial os trabalhadores da Administração Pública vão ser afectados com um corte nas despesas com pessoal de quase 1 300 milhões de euros entre 2013 e 2018, o que forçosamente significará uma de duas coisas – ou uma redução considerável do nº de trabalhadores ou uma redução salarial – com consequências óbvias na qualidade dos serviços públicos e na contínua degradação das condições de vida de milhares e milhares de funcionários públicos. Ao mesmo tempo que continuará com os cortes nos vários ministérios com especial enfase na educação e na saúde.

      Percebe-se que a carga fiscal que depois do enorme aumento de impostos suportados pelos trabalhadores, reformados e pensionistas atingiu os 25,4% do PIB em 2013, não irá baixar nos próximos anos, ao contrário do que o Governo afirma, mas subirá ainda mais para os 25,5% em 2018. Para isso certamente contribuirá o aumento da taxa normal do IVA de 23% para 23,2%, bem como o aumento dos impostos específicos sobre o consumo.

       Percebe-se que o Governo pretende agora transformar uma medida que dizia transitória como a Contribuição Extraordinária de Solidariedade sobre grande parte dos trabalhadores da Administração Pública e sobre parte dos reformados e pensionistas, numa medida definitiva a que chama agora contribuição de sustentabilidade.

       Percebe-se que o governo pretende compensar a redução da receita com a contribuição extraordinária de solidariedade (CES), com o aumento da taxa social única (TSU) sobre os trabalhadores de 11% para 11,2%, mantendo no entanto inalterável a contribuição do patronato para a TSU. 
 
       Percebe-se que ainda não satisfeito com as privatizações que já efectuou (EDP, REN, Caixa Saúde, Galp, ANA, CTT e Caixa Seguros) em que como reconhece arrecadou 8,5 mil milhões de euros, pretende avançar em 2014 com a privatização da Empresa Geral de Fomento (EGF), com a última fase de privatização da REN, com a privatização da TAP, da parte dos CTT que ainda detém, com a CP carga e com as concessões dos serviços públicos de transportes de Lisboa (Metro e Carris) e do Porto (STCP e Metro).

        Uma última nota para me referir ao cenário macroeconómico apresentado em relação ao qual tenho muitas e fundadas dúvidas. Em primeiro lugar depois de nos últimos 12 anos o PIB ter estagnado em termos médios anuais, com uma taxa média anual (tma) de 0% e ter caído em 5 anos, 4 dos quais nos últimos 5 anos, não acredito que a nossa economia possa nos próximos 5 anos crescer ininterruptamente a uma tma de 1,6%. Como não acredito que as nossas exportações possam crescer neste mesmo período a uma tma de 5,3%, nem que o Investimento possa crescer a uma tma de 3,8% entre 2014 e 2018, quando nos últimos 15 anos caíu a uma tma de 3% com quebras no investimento em 10 dos últimos 15 anos. Este é sem dúvida um cenário macroeconómico eleitoralista que procura esquecer as verdadeiras razões porque o nosso país estagnou desde que aderimos ao euro. Não é possível o nosso país crescer de forma sustentada por um período mais ou menos longo sem que as verdadeiras razões que nos conduziram à actual situação sejam atacadas. Pensar o contrário é verdadeira ilusão!
CAE, 6 de Maio de 2014
José Alberto Lourenço

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