domingo, 16 de novembro de 2008

"E se...Obama não fosse do Partido Democrático?", por Fernando S. Marques


Caros amigos,
Recebi, por várias vias, um lindíssimo texto de Mia Couto (mais um) chamado "E se Obama fosse africano?" que aqui vai para os que ainda não o leram.
Mas apeteceu-me, numa vontade avassaladora, escrever também um texto chamado "E se Obama não fosse do Partido Democrático?"
Trata-se apenas de acrescentar uma reflexão mais. Sobre a mitigada democracia americana. Particularmente para os que descobriram, agora, virtudes, onde, antes, só havia defeitos. E, também, para os que apenas acedem à informação vendida, nos intervalos da publicidade, por noticiários pré-formatados, por comentadores que repetem banalidades, por gente que precisa dessas actividades para sobreviver financeira ou politicamente.
Aqui vai.
...
E SE OBAMA NÃO FOSSE DO PARTIDO DEMOCRÁTICO?
Também chorei na noite eleitoral. Por muitas razões, uma das quais por ter sentido a vitória de Obama como um pouco minha também. Fiz o que pude para ajudar.
Mas...
... a vida política americana é dominada por dois partidos e, tudo o resto, é chamado de "independente". Em todos os discursos dos políticos americanos (o próprio Obama), de jornalistas e comentadores, de gente bem ou mal pensante, o que se ouve é "Democratas, Republicanos e Independentes", ou "Republicanos, Democratas e Independentes", ou mais simplesmente "Republicanos e Democratas".
Se Obama não fosse do Partido Democrático, seria "independente", mesmo que estivesse filiado noutro partido. E, para além disso...
... Não teria falado na Convenção de 2004, a convite de Kerry, fazendo uma brilhante intervenção transmitida em directo pelos principais canais da televisão.
... Não teria sido eleito para o Senado de Illinois.
... Os seus livros talvez não tivessem sido publicados e, se o fossem, não teriam a aceitação que tiveram.
... Seria um entre milhares de activistas pelos direitos cívicos que ninguém conhece.
... Ainda estaria a pagar o empréstimo que lhe foi concedido para tirar o curso em Harvard.
... Dificilmente viria a ser candidato a qualquer coisa, a menos que se inscrevesse num dos muitos Partidos que existem nos EUA. Existem muitos Partidos nos EUA! Alguém sabe?
... Se conseguisse ser candidato a Presidente dos EUA não teria acesso aos meios de comunicação social, como aconteceu com mais de uma dúzia de candidatos (de outros Partidos) de que a maior parte das pessoas desconhece a existência.
... Quando se contassem os votos, deixaria positivamente de existir, porque, como quase toda a gente sabe só havia dois candidatos; tudo o resto não tinha interesse, nem jornalístico, nem cultural, nem social.
...
Talvez estejam a ler com surpresa o que escrevo. No entanto, os que melhor me conhecem não estranharão.
Fez-se História ao eleger Obama.
Mas é bom que se tenha consciência das circunstâncias da História.
É bom, também, que não se considere esse acontecimento como um fim em si próprio, mas como uma etapa mais do processo histórico.
Será bom que a esperança que Obama despertou dê frutos e não estiole. Estarei presente. Mas...
O mundo aguarda. Os abutres também.
...
Um grande abraço,
fernando

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