sexta-feira, 30 de março de 2012

A frase de fim-de-semana, por Jorge

"O mínimo que nos é exigível
é o máximo que somos capazes de fazer"

Manuel António Pina
(poeta / prémio Camões 2011
e cronista do JN, nasc. 1943)

Numa manhã de 1973, com o regime abalando...

A CDE organiza a romagem do 5 de Outubro no Alto S. João. A polícia presente diz "E agora pode falar um sr. candidato...". Estou a responder, em nome dos outros que lá estavam "Os candidatos da CDE não falam às ordens da Polícia". à saída o Pedro Coelho ainda subiu para cima de um pilarete e disse umas palavras. À saída, seria uma vez mais a carga policial e a detenção de uns vinte de nós na esquadra de Santa Apolónia.
Na foto, tapado por mim está o Urbano Tavares Rodrigues, e ainda Teresa Dias Coelho, Herberto Goulart, Arons de Carvalho, o Xico de Sacavém e o querido camarada já falecido, Euclides Pereira.

quinta-feira, 29 de março de 2012

Uma bela noite na Gulbenkian

Anteontem, a propósito de um concerto, reuniam-se vários pontos de interesse na Gulbenkiam.
Uma das melhores orquestras sinfónicas do mundo (de Göteborgs, da Suécia).
Um dos mais carismáticos e jovens maestros em carreira internacional (o venezuelano Gustavo Dudamel).
Dois grandes nomes da música com algumas das suas grandes peças (Richard Strauss e Joseph Haydn).
Uma das peças interpretadas foi "Assim falou Zaratustra" que ultrapassou no conhecimento público as dimensões normais da cultura musical por ter sido o tema do filme "Odisseia no espaço" de Stanley Kubrick.
O grande auditório estava cheio. Várias chamadas consecutivas ao palco e um belo encore traduziram o entusiasmo do público para com as interpretações.

Transformar o Código do Trabalho numa camisa de forças dos patrões

Com esta nova alteração ao Código de Trabalho, em debate na AR, os patrões passarão a despedir mais facilmente, a gerir arbitrariamente os horários de trabalho, a reduzir salários e indemnizações por despedimento e subsídios de desemprego, a aumentar o tempo de trabalho, a exploração e a insegurança dos trabalhadores, generalizar a precariedade.


O Ministro da Economia chegou ao cúmulo do cinismo de afirmar que eram medidas favoráveis aos trabalhadores...porque provocaria um. aumento da competitividade. Como Octávio Teixeira sublinhou hoje na Antena Um, as duas anteriores alterações ao Código, justificadas com tal "objectivo", não o atingiram e, pelo contrário aumentaram o emprego e o emprego desprotegido.
Se virmos quem é atingido pelas medidas até agora decididas enquadradas pelo plano da troika e mais estas agora previstas fica claro que todas prosseguem objectivos estratégicos que nada têm a vêr com a saída da crise e o crescimento da economia mas tão só com o que ideologia neo-liberal pretende: a diminuição drástica dos custos de trabalho, o empobrecimento dos portugueses e o cerceamento de direitos sociais básicos.

São os grupos económicos e a banca a falar mais grosso.
Mas não ficarão a falar sózinhos.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Como elas se preparam...

Andam por aí umas almas caridosas a queixar-se da CGTP-IN por não admitir que certos "movimentos" se incorporem nas suas manifestações, pelo conhecimento que há de que deixam alojar no seu seio grupos provocadores.
E cujo papel é "justificar" medidas policiais despropositadas contra manifestantes que provoquem uma redução de apoio social interno às suas lutas e dar a "repórteres" estrangeiros ou nacionais as imagens que em todo o mundo serão a única forma que as respectivas opiniões públicas têm de interpretar a dimensão e justeza das lutas noutros países.
Vejamos como agiram no passado dia 22, dia da greve geral
Chegam escoltados pela polícia
Combinam as coisas com a polícia


Arrancam para a Rua Garret

Rebenta um pequeno petardo, a polícia fecha a rua para garantir
que os presentes se desloquem para o cenário mediático previamente definido: a Brasileira

As imagens de video e fotos arrancam e captam sucessivamente os "manifestantes"  a destruir loiça e a esplanada e a polícia a fazer algo de semelhante.
Recomendo o cotejo destas fotos com as imagens até aqui publicadas para descobrir não inocentes coincidências...







sexta-feira, 23 de março de 2012

Frase de fim-de-semana, por Jorge

Adicionar legenda
"Não há nada mais cómico que a infelicidade"

Samuel Beckett em Endgame (1957)






quarta-feira, 21 de março de 2012

Todos os dias novas razões para uma grande greve geral

Dar continuidade às desvalorizações internas (quebras de salários e pensões) impostas aos países com dificuldades é um erro que contraria a competitividade e gera a recessão profunda, falências, desemprego e mais pobreza.
Octávio Teixeira defende hoje na sua crónica semanal no Jornal de Negócios que se traduzisse uma "caixa" de uma peça sobre estas experiências que integra, contraditòriamente, o relatório da missão do FMI que recomendou o novo pacote de resgate à Grécia que os gregos tão vivamente têm contestado.

Também ontem fonte oficial   nos permitiu ficar a saber que em Portugal, o deficite do Estado (por  aí fiquemos) durante Fevereiro, triplicarta em relação a período homólogo do ano passado.
No que respeita às quebras nas receitas isso decorre essencialmente de menores impostos cobrados à actividade produtiva que se reduziu significativamente. E poderá servir de pretextyo a mais uma opção criminosa como a que se prepara com a privatização dos Esteiros Navais de Viana do Castelo.
No que respeita ao aumento das despesas, dizer como Marcelo Rebelo de Sousa ou Miguel Frasquilho que ela se não repetirá noutros períodos ignora que vão existir, sim, infelizmente, novas elevadas despesas como as que decorrem de uma importante subida das taxas de juros e vendas de obrigações.
Por seu lado, Seguro declarou-se admirado com a subida da despesa do Estado, atribuindo isso a um genérico" descontrolo em vez de sublinhar causas como o aumento das despesas sociais (só o subsídio de desemprego subiu 18% no período referido...). Estará Seguro a preparar nova campanha contra as "gorduras" do Estado que gerariam novas ameaças a emprego e direitos sociais básicos como a Saúde e a Educação?

Para os que consideram "inevitáveis" os sucessivos pacotes de austeridade, importa não deixar de salientar que tais pacotes estão a gerar os efeitos contrários aos que "justificaram" o seu lançamento
Faz todo o sentido, pois, a greve geral de amanhã.

sábado, 17 de março de 2012

Seara Nova -90 anos de intervenção cívica e cultural

A exposição itinerante comemorativa do 90ª Aniversário da Seara Nova estará no Palácio Galveias, ao Campo Pequeno,  até finais do mês de Abril.

A inaugurar no sábado, dia 24 de Março, às 17 horas, durante um convívio da Comissão de Honra das Comemorações com o Conselho Redatorial da Seara Nova e com outos colaboradores, a Exposição tem por tema 90 Anos de Intervenção Cívica e Cultural e estará patente ao público de 3ª feira a 6ª feira entre as 10 e as 19 horas; à 2ª feira e ao sábado entre as 11 e as 19 horas.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Frase de fim-de-semana, por Jorge

"Entre o forte e o fraco, e entre o rico e o pobre,
e entre o senhor e o escravo,
a liberdade é que oprime e o que liberta é a lei"

Jean-Baptiste Lacordaire
Padre dominicano e activista político francês,
1802-1861

quarta-feira, 14 de março de 2012

Director do Golden Sachs demite-se devido à "bancarrota moral" do banco

Segundo o jornal Económico, um director da área de instrumentos derivados do Goldman Sachs demitiu-se hoje por considerar que os colaboradores do gigante norte-americano entraram em "bancarrota moral". Num artigo de opinião, publicado no "The New York Times", Greg Smith explicou porque abandonou o banco, após 12 anos na entidade.

Greg Smith explicou a sua posição referindo que os responsáveis do banco deixaram de se preocupar com os interesse dos clientes, mas sim com o dinheiro que lhes poderiam tirar. Referiu mesmo que houve cinco directores do banco que chamaram aos seus clientes "fantoches".
Num comunicado citado pelo "Financial Times", o Goldman Sachs reagiu, referindo que "discordamos com as perspectivas expressas, que nós pensamos que não reflectem a forma como gerimos o nosso negócio".
O director demissionário do banco referiu que "espera que [o artigo de opinião] sirva para acordar o conselho de administradores", avisando que "as pessoas que se preocupam apenas em fazer dinheiro não irão sustentar a firma - ou a confiança dos clientes - por muito mais tempo".
O artigo deste ex-director do GS no York Times sobre a sua decisão  pode ser lida, em inglês, na íntegra aqui.

terça-feira, 13 de março de 2012

As andorinhas de volta, por Jorge

Todos os anos:

a mesma excitação,

a mesma chilreada,

o mesmo repouso...

a mesma novidade.

Benvindas!

sexta-feira, 9 de março de 2012

Frase de fim-de-semana, por Jorge


Fountain - R. Mutt, aliás M. Duchamp (1917)
[fotografia de Alfred Stieglietz].jpg

"Forcei a contradizer-me para evitar
conformar-me com o meu próprio gosto"

Marcel Duchamp (artista francês ligado
ao dadaísmo e ao surrealismo, 1887-1968)







quinta-feira, 8 de março de 2012

"O libertino", no Teatro da Trindade

Fomos ontem ver esta peça de Éric-Emmanuel Schmitt, encenada e traduzida por José Fonseca e Costa.
O personagem central é Diderot (José Raposo).
Nesse dia sucedem-se-lhe desempenhos de inveterado mulherengo, onde Madame Therbouche (Maria João Raposo) o desenha, reclamando-lhe que o deixe pintar "tal como a natureza o fez vir ao mundo", a sua própria mulher e uma outra jovem o disputam, conferindo à peça um carácter sensual marcante.
Isto decorre enquanto ao longo da acção Diderot procura escrever um texto sobre sobre a Moral para a Enciclopédia a que se tem entregue.
A libertinagem e a escrita vão-se influenciando com um desfecho inesperado.
Uma comédia interessante atravessada por uma discussão filosófica...

domingo, 4 de março de 2012

Vera Mantero no S. Luiz, comentada por Jorge

não só dança... também canta!

e bem,
com nervo, ironia e finura

(tudo: Berlin, Weil, Trenet, Jobim, Porter, Caetano...)

não percam se a virem por aí
(na próxima, o aviso tem que ser antes, reconheço...)

sábado, 3 de março de 2012

Um tempo sem nome ou o novo conceito de envelhecer, de Rosiska D. de Oliveira (Globo, 12/01/2012)

Transcrevo o que Margarida Pino escrveu no Facebook.

O namoro do Chico Buarque com a cantora ruiva Thais Gulin rendeu para nós este primor de blues ESSA PEQUENA ( ao lado), Mas rendeu também a interessante crônica UM TEMPO SEM NOME da escritora Rosiska Darcy de Oliveira sobre “o novo conceito de envelhecer".


Com seu cabelo cinza, rugas novas e os mesmos olhos verdes, cantando madrigais para a moça do cabelo cor de abóbora, Chico Buarque de Holanda vai bater de frente com as patrulhas do senso comum. Elas torcem o nariz para mais essa audácia do trovador. O casal cinza e cor de abóbora segue seu caminho e tomara que ele continue cantando “eu sou tão feliz com ela” sem encontrar resposta ao “que será que dá dentro da gente que não devia”.

Afinal, é o olhar estrangeiro que nos faz estrangeiros a nós mesmos e cria os interditos que balizam o que supostamente é ou deixa de ser adequado a uma faixa etária. O olhar alheio é mais cruel que a decadência das formas. É ele que mina a autoimagem, que nos constitui como velhos, desconhece e, de certa forma, proíbe a verdade de um corpo sujeito à impiedade dos anos sem que envelheça o alumbramento diante da vida .

Proust, que de gente entendia como ninguém, descreve o envelhecer como o mais abstrato dos sentimentos humanos. O príncipe Fabrizio Salinas, o Leopardo criado por Tommasi di Lampedusa, não ouvia o barulho dos grãos de areia que escorrem na ampulheta. Não fora o entorno e seus espelhos, netos que nascem, amigos que morrem, não fosse o tempo “um senhor tão bonito quanto a cara do meu filho“, segundo Caetano, quem, por si mesmo, se perceberia envelhecer? Morreríamos nos acreditando jovens como sempre fomos.

A vida sobrepõe uma série de experiências que não se anulam, ao contrário, se mesclam e compõem uma identidade. O idoso não anula dentro de si a criança e o adolescente, todos reais e atuais, fantasmas saudosos de um corpo que os acolhia, hoje inquilinos de uma pele em que não se reconhecem. E, se é verdade que o envelhecer é um fato e uma foto, é também verdade que quem não se reconhece na foto, se reconhece na memória e no frescor das emoções que persistem. É assim que, vulcânica, a adolescência pode brotar em um homem ou uma mulher de meia-idade, fazendo projetos que mal cabem em uma vida inteira.

Essa doce liberdade de se reinventar a cada dia poderia prescindir do esforço patético de camuflar com cirurgias e botoxes — obras na casa demolida — a inexorável escultura do tempo. O medo pânico de envelhecer, que fez da cirurgia estética um próspero campo da medicina e de uma vendedora de cosméticos a mulher mais rica do mundo, se explica justamente pela depreciação cultural e social que o avançar na idade provoca.

Ninguém quer parecer idoso, já que ser idoso está associado a uma sequência de perdas que começam com a da beleza e a da saúde. Verdadeira até então, essa depreciação vai sendo desmentida por uma saudável evolução das mentalidades: a velhice não é mais o que era antes. Nem é mais quando era antes. Os dois ritos de passagem que a anunciavam, o fim do trabalho e da libido, estão, ambos, perdendo autoridade. Quem se aposenta continua a viver em um mundo irreconhecível que propõe novos interesses e atividades. A curiosidade se aguça na medida em que se é desafiado por bem mais que o tradicional choque de gerações com seus conflitos e desentendimentos. Uma verdadeira mudança de era nos leva de roldão, oferecendo-nos ao mesmo tempo o privilégio e o susto de dela participar.

A libido, seja por uma maior liberalização dos costumes, seja por progressos da medicina, reclama seus direitos na terceira idade com uma naturalidade que em outros tempos já foi chamada de despudor. Esmaece a fronteira entre as fases da vida. É o conceito de velhice que envelhece. Envelhecer como sinônimo de decadência deixou de ser uma profecia que se autorrealiza. Sem, no entanto, impedir a lucidez sobre o desfecho.

”Meu tempo é curto e o tempo dela sobra”, lamenta-se o trovador, que não ignora a traição que nosso corpo nos reserva. Nosso melhor amigo, que conhecemos melhor que nossa própria alma, companheiro dos maiores prazeres, um dia nos trairá, adverte o imperador Adriano em suas memórias escritas por Marguerite Yourcenar.

Todos os corpos são traidores. Essa traição, incontornável, que não é segredo para ninguém, não justifica transformar nossos dias em sala de espera, espectadores conformados e passivos da degradação das células e dos projetos de futuro, aguardando o dia da traição.Chico, à beira dos setenta anos, criando com brilho, ora literatura , ora música, cantando um novo amor, é a quintessência desse fenômeno, um tempo da vida que não se parece em nada com o que um dia se chamou de velhice. Esse tempo ainda não encontrou seu nome. Por enquanto podemos chamá-lo apenas de vida.

Frase de fim-de-semana, por Jorge

"Aquilo que pode ser afirmado sem provas
pode ser rejeitado sem provas"

Christopher Hitchens
(autor anglo-americano, 1949-2011)

"O medo de Carlos Drummond de Andrade

O Medo é o que caridosamente nos resguarda e impede de naufragarmos em nós próprios. Ajuda-nos na ilusão. Ajuda-nos na segurança ilusória.


O Medo que evita naufragarmos num mar mais amplo e tanto mais perigoso quanto é a nossa incapacidade de/para nadar...

 

Vejamos como fala dele Carlos Drummond de Andrade.


  O Medo

Em verdade temos medo.
Nascemos no escuro.
As existências são poucas;
Carteiro, ditador, soldado.
Nosso destino, incompleto.
E fomos educados para o medo.

Cheiramos flores de medo.

Vestimos panos de medo.

De medo, vermelhos rios

Vadeamos.

Somos apenas uns homens e a natureza traiu-nos.

Há as árvores, as fábricas,

Doenças galopantes, fomes.

Refugiamo-nos no amor,

Este célebre sentimento,

E o amor faltou...

O medo, com sua capa,

Nos dissimula e nos berça.

Fiquei com medo de ti,

Meu companheiro moreno.

De nos, de vós, e de tudo.

Estou com medo da honra.

Assim nos criam burgueses.

Nosso caminho: traçado.

Por que morrer em conjunto?

E se todos nós vivêssemos?

Vem, harmonia do medo,

Vem ó terror das estradas,

Susto na noite, receio

De águas poluídas. Muletas

Do homem só.

Ajudai-nos, lentos poderes do

Láudano.

Até a canção medrosa se parte,

Se transe e cala-se.

Faremos casas de medo,
Duros tijolos de medo,
Medrosos caules, repuxos,
Ruas só de medo, e calma.
E com asas de prudência
Com resplendores covardes,
Atingiremos o cimo
De nossa cauta subida.
O medo com sua física,
Tanto produz: carcereiros,
Edifícios, escritores,
Este poema,
Outras vidas.
Tenhamos o maior pavor.
Os mais velhos compreendem.
O medo cristalizou-os.
Estátuas sábias, adeus.
Adeus: vamos para a frente,
Recuando de olhos acesos.
Nossos filhos tão felizes...
Fiéis herdeiros do medo,
Eles povoam a cidade.
Depois da cidade, o mundo.
Depois do mundo, as estrelas,
Dançando o baile do medo.